terça-feira, 1 de maio de 2007

Relógio de Bolso...



As horas nunca tinham custado tanto a passar com hoje. Parece que a ansiedade, combinada com a impaciência, fazia com que os ponteiros do relógio andassem mais devagar.

Tudo me parecia estar a incomodar, sentia os sapatos a apertarem-me, a gravata parecia que tinha um contador que, a cada segundo, me ia sufocando cada vez mais e, até o meu chapéu de coco, que sempre me ficara bem, hoje parecia que se encaixava melhor à cabeça de um jumento do que à minha. E o eléctrico que todos os dias ia apinhado, hoje parecia estar ainda mais lotado, estando eu mesmo no meio daquele concentrado de gente. “Como será que ela irá reagir? Será que sente o mesmo?” pensava eu para comigo enquanto dava mais uma espreitadela ao relógio de bolso.

O eléctrico teimava em não querer acelerar o passo e eu começava a pensar que quando chegasse ao pé dela, o ramo de flores que trazia, já estaria murcho. Eu sabia que não estava atrasado mas a ânsia estava cada vez mais a descontrolar-me. Tinha de me abstrair depressa se não rebentava.

Foi então que ao olhar em meu redor reparei que havia coisas que me lembravam a presença dela. A sombrinha azul da senhora que estava atrás de mim lembrou-me da vez em que nos molhámos dos pés à cabeça e tivemos que ir a pé para casa, o óculo do senhor de fraque que estava ao meu lado esquerdo lembrou-me do Sargento Jordão, um dos homens de mau carácter que faz parte do passado dela porque lhe roubou o coração e a fez sofrer logo a seguir, a criança sentada ao colo da mãe e com um barquinho na mão fez-me lembrar da primeira vez que fomos à praia com os amigos em comum e ela, vestida com o seu fato de banho um pouco acima do joelho, entrou sempre de maneira alegre e simpática nas nossas brincadeiras de rapazes, não se importando de perder a sua compostura de senhora em favorecimento da diversão. À minha frente, lá ao fundo, o condutor do eléctrico fez-me lembrar das vezes em que nós os dois íamos para a estação dos comboios e ficávamos ali sentados a tarde toda simplesmente a conversar e a admirar as diferentes “figuras” que por ali passavam (nobres de nariz empinado, estudantes de pouco estudo, crianças com birras, mães sem paciência para as mesmas, caixeiros viajantes que perdiam as bagagens ou simplesmente aqueles atrasados que ainda corriam atrás do comboio).

Eram tantas as ligações que eu ali encontrava que me abstrai por momentos de tudo, inclusive do sitio onde deveria ter saído do eléctrico, mas apesar de a única solução que arranjei foi ter saído do eléctrico em andamento, não me preocupei ter “estado” aqueles momentos com ela fez-me perder por completo a ânsia e a impaciência que tinha.

A caminho do local onde eu tinha mandado recado para nos encontrarmos, passei por um café que tinha como musica de fundo no giradiscos a “In The Mood” de Glenn Miller, uma das músicas que ela adorava e que eu associava sempre a imagem de a ver dançar, sempre acompanhada do seu sorriso e da boa disposição, que tendo ela a vida como madrasta, tinha sempre força e coragem para continuar em frente.

Apreciei um pouco a música e continuei depois até chegar ao local marcado. Acabara por chegar minutos antes da hora ao banco do jardim que tinha vista para a cidade. Era um dos locais onde também costumávamos estar a conversar sobre os problemas de cada um e a apoiarmo-nos mutuamente. O verde do jardim que estava atrás de mim fazia contraste com o branco e cinzento da cidade que estava à minha frente. Todo o espaço me parecia diferente hoje, os prédios pareciam ter ganho mais altura e magnificência e à minha frente do outro lado da rua, o local onde se fazia o envio e recepção de encomendas, tinha ganho um brilho especial.

O sol a bater de frente para o balcão, a empregada loira que encantava os clientes, tanto ao telefone como ao balcão e no fundo uma pessoa a ordenar as encomendas de forma organizada formavam uma imagem do dia-a-dia que seria um bom mote para uma pintura de um quadro.

Apesar do contraste em meu redor, tudo me dava a entender que aquele era o sítio e o momento certo para lhe dizer o que sentia, e eu não parava de pensar na maneira como lhe iria dizer. De súbito por entre os pensamentos ouvi uma voz que me perguntou: “Para quem é esse ramo de flores?”, perguntou ela na sua maneira simples e meiga à medida que se aproximava de mim.

A ânsia tinha voltado e, por momentos, fiquei sem palavras e sem saber o que fazer, mas depressa me recompus ao reparar no seu sorriso.

- É para alguém especial… É para ti! Preciso de te dizer uma coisa que sinto.

- Sim, eu sei! – Respondeu ela com um olhar e um sorriso de quem já sabia o que eu iria dizer e que também sentia o mesmo.

Nesse momento, nessa troca de olhares e feições, meio envergonhados, tudo o que estava à nossa volta abrandou, mostrando que o relógio de bolso estava finalmente em sintonia com o mundo exterior.

By CT Carvalheiro

3 comentários:

Diana Rute disse...

Desta vez não coloquei nada escrito por mim... Coloquei um texto bem melhor... =P
Só pra dizer que sim senhor, o menino tem muito jeitinho e afinal não correu assim tão mal ter-se inspirado numa certa e determinada pessoa... =P
(ba la, inspirou-se um bocadinho de nada... lol)
Beijo pra todos

Anónimo disse...

Eu acho que correu optimamente bem, ter m inspirado na menina diana rute:D
Mas tb foi em jeito de uma pequenina homenagem ao que ela é, ao que ela transmite, ao k ela simboliza...por isso tinha td para correr bem:P Obrigado por td pekena 1bj enorme*

miana disse...

Um texto mto sincero e terno.

Gostei.

*kiss para os 2 (artista e musa)*